O que é cristianismo policêntrico?

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A Ascensão Africana

Wanjiru Gitau, Seyram Amenyedzi & Fohle Lygunda

Paulo alegrava-se com os Colossenses, em sua época, porque o evangelho crescia e produzia fruto (Colossenses 1:6). Da mesma forma, nós damos graças a Deus pelo bem aceito fato do cristianismo ter experimentado um rápido crescimento na África ao longo do último século. Segundo a última edição da World Christian Encyclopedia, 26% de todos os cristãos vivem na África, sendo que o continente africano comporta cerca de 18% da população mundial. Em termos relativos, a África possui o maior percentual de cristãos no mundo, seguido por 24% na America Latina, 23% na Europa, 15% na Ásia, 11% na América do Norte e 1% na Oceania.1 De fato, Deus se lembrou de seu amor e de sua fidelidade para com Israel, e todos os confins da terra viram a salvação do nosso Deus (Salmo 98:3).

A Ascensão da África

Enquanto a propagação do evangelho testifica do poder do Espírito Santo, o avanço histórico do cristianismo na África não aconteceu num vácuo. O continente tem passado por monumentais ondas de transformação social que influenciam a forma como imaginamos a tarefa da Grande Comissão para as próximas décadas. Durante muito tempo, pobreza e doenças, subdesenvolvimento, governança política fraca e falta de infraestrutura moderna colocaram o continente bem atrás de outras regiões do mundo em termos de desenvolvimento social. Em décadas recentes, quatro marcadores de mudança produziram uma nova narrativa, de maneira geral vista como a “África em Ascensão”.

Um aumento no espaço político democrático 

Apesar de insistentes eventos de instabilidade política e recorrentes crises, a África como um todo desfruta de maior liberdade democrática do que tinha antes dos anos 2000, e, quando os conflitos ocorrem, eles são resolvidos em bem menos tempo. Esta estabilidade promove outras mudanças positivas.

Visível crescimento econômico

É possível enxergar este crescimento através de uma série de índices de desenvolvimento, por exemplo: taxas de mortalidade infantil mais baixas, melhor acesso a serviços de saúde e maior acesso à educação formal em níveis superiores. Todos estes números contribuem para a melhoria da qualidade de vida. A juventude africana está explorando os campos da tecnologia, da moda, da música, da educação, do empreendedorismo e do universo financeiro para tirar o continente de uma posição marginal em assuntos mundiais para ser o centro das atrações globais. O afro-pessimismo arraigado deu lugar à constatação de que a África é um mercado emergente para bens de consumo e serviços globais, e possui matérias-primas essenciais para a indústria mundial. Esta reapreciação, de fato, vem acompanhada de novos modos de exploração; para os africanos, porém, ter acesso a plataformas globais antes inalcançáveis representa ter mais igualdade de condições de concorrência.    

Atenção global em razão do crescimento populacional

Figura 1: Mapa “The True Size of Africa” [O Verdadeiro Tamanho da África] produzido por Kai Kruse (http://kai.sub.blue/en/africa.html)

Em 2023, a população da África somava cerca de 1,4 bilhões de pessoas, 15% das quais com menos de 15 anos de idade. Espera-se que a população dobre até 2050.2 O aumento projetado deve se concentrar num número específico de países já densamente populosos como a República Democrática do Congo, o Egito, a Etiópia, a Nigéria e a Tanzânia. Ao mesmo tempo, em termos de extensão territorial e em comparação a outros continentes, a África é mais do que capaz de sustentar sua população.

Incrível urbanização

Com uma taxa de urbanização de 47%, a África tem experimentado um dos índices de urbanização mais rápidos no mundo, atingindo os mesmos níveis do resto do globo neste quesito. O crescimento inclui infraestrutura – ainda que com dívidas –, inovações para o setor de moradia, reavaliação de direitos sobre a terra e reducão das miseráveis favelas do passado. As cidades revigoradas exibem, a cada dia, arranha-céus reluzentes e periferias com luxuosas moradias, além da preseça de comércio de varejo, sistemas de transporte local e regional, telecomunicações local e internacional, e indústria de esporte e entretenimento. Com maior acesso e integração regionais, as bases de consumidores só aumentam.

Figura 2: População africana

Perspectivas para a Grande Comissão

As quatro principais mudanças citadas acima, a saber, o aumento do espaço democrático, a visível melhoria econômica apesar de insistentes marginalidades, o aumento nas populações e a rápida urbanização, devem criar um pano de fundo para o engajamento missional em todo o continente. Abaixo destacam-se algumas áreas-chaves nsa quais concentrar os esforços.

Alcançar estudantes de todos os níveis 

Primeiro, a mudança da curva populacional africana produziu uma base populacional maior, formando uma estruturura de pirâmide. O crescimento exponencial no setor de educação formal se correlaciona com esta mudança. De 2000 a 2010, quase todos os países africanos experimentaram avanços marcantes nas matrículas dos ensinos fundamental e médio, e no ensino superior voltado ao empreendedorismo. O ensino superior ajuda democratizar nações e estabilizar economias; assim, torna-se um bem desejável. A educação também está por trás do aumento da população de jovens adultos que busca, conscientemente, tornar-se conhecedora da cultura, da tecnologia e da globalização. 

Faz-se necessário um foco considerável para que aconteça a evangelização e o discipulado dos estudantes em todos o estágios. Nesta próxima fase da missão cristã, é absolutamente vital que as ações de evangelismo e discipulado concentrem-se nos jovens adultos que acessam o ensino superior, nas faculdades e universidades. O dinâmico trabalho de ministérios estudantis locais, fundados por ex-alunos, como o FOCUS Kenya (Fellowship of Christian Unions) e todos os ministérios universitários afiliados ao IFES (International Fellowship of Evangelical Students) – NIFES-Nigeria, GHAFES-Gana e IFES África Francófona – oferecem modelos especialmente instrutivos de como evangelizar jovens adultos no continente africano. O FOCUS Kenya, em particular, tem causado enorme impacto e pode ensinar modelos de evangelização de estudantes universitários em locais onde este tipo de trabalho não criou raízes. Considerando o fato de que a população com formação universitária se tornará a classe média que influenciará a trajetória do resto da sociedade, este trabalho é, de fato, vital. 

Atenção à transformação da classe média

Nas décadas pós-guerra, a sociedade ocidental passou por uma fase similar de crescimento assim como a atual experiência da África. A classe média ocidental cresceu a partir dos jovens que se formavam nas universidade e tornavam-se advogados, médicos, professores, gerentes, administradores, empreendedores e, também, uma classe de trabalhadores comuns em empregos estáveis, cuja atuação servia de apoio ao crescimento. Apesar das condições dos mercados de trabalho que se transformam não produzirem profissões estáveis a longo prazo, uma substancial base de classe média está se formando na África, embora ainda não muito representativa. Neste ponto, é mister alguns questionamentos sobre padrões de secularização e desacralização da esfera pública, e sobre a privatização da fé. Embora as sociedades se apresentem em diferentes condições particulares, cabe às igrejas conscientizá-las de que as futuras gerações poderão achar a igreja cada dia mais irrelevante. Nesta última fase do crescimento da igreja africana, a maior ênfase tem sido na plantação de igrejas, com foco basicamente em conversões e no crescimento numérico. Para além do crescimento numérico, não fica claro se existe algum segmento das igrejas africanas investindo na formação de uma visão cristã que lide com as populações que se metamorfoseam (literalmente que se transformam, com frequência). Os currículos teológicos de seminários que treinam pastores tem um papel a cumprir neste processo de formar uma visão, e há algo a mais nesta visão. Em face das múltiplas e competitivas visões secularizadas que excluem, por completo, a espiritualidade, há uma necessidade urgente de as igrejas investirem, de maneira consciente, na construção de uma visão biblicamente ética e moral para suas sociedades.

 Embora as sociedades se apresentem em diferentes condições particulares, cabe às igrejas conscientizá-las de que as futuras gerações poderão achar a igreja cada dia mais irrelevante.

Reavaliando a dependência de recursos e contingências do passado missionário 

Se, de fato, as condições materiais da África evoluíram, crédito deve ser parcialmene dado à igreja ocidental – primariamente a grandes organizações baseadas na fé, como Visão Mundial, Compassion Internacional, Food for the Hungry e Tear Fund, junto com tantas outras organizações cristãs patrocinadas pelo ocidente, que foram pioneiras na melhoria das condições materiais. Não se pode negar este fato. Mesmo missionários individuais, equipes de missões de curto-prazo e iniciativas comunitárias demostraram grande solidariedade às comunidades carentes africanas com uma vasta variedade de projetos de microfinanciamento, especialmente em apoio às mulheres, ao apadrinhamento de crianças e a orfanatos. Recentemente, o formato “business as mission”, ou negócios como missões, se juntou ao coro dos bons negócios feitos para a melhoria do bem-estar material, em nome de Cristo. Em si mesmo, o crescimento econômico, e mesmo o do consumo, para uma população permanentemente desfavorecida é um bem desejável defendido pela missão cristã.

Olhando para o futuro, algumas questões importantes devem ser ponderadas junto com esses esforços, particularmente porque o trabalho focado no desenvolvimento tem apoio, por assim dizer, da “Missão S/A” no ocidente.3 A relação entre a misericórdia cristã, de um lado, e a dependência material (ao invés da fé), do outro lado, deve ser tratada. As questões de relações de poder nas co-dependências, apesar da intenção colaborativa, exigem uma auto-consciência reflexiva da parte de missionários e de comunidades mantenedoras externos. Da mesma forma, a tensão entre a genuína necessidade material e o consumismo acumulador desprovida de uma visão teologicamente bem embasada não pode ser ignorada na África emergente. Além do mais, à medida que as economias ocidentais mudam (declinam?) será necessário reavaliar os padrões de fornecimento e de acesso a recursos institucionais do ocidente atentando-se à sustentabilidade das iniciativas missionárias dependentes de organizações.4

Missão: Retrospectiva e Expectativa

Numa análise de 2010 do centenário da Edinburgh Missionary Conference realizada em 1910, em um capítulo adequadamente entitulado “Uma Nova Era de Missões se Aproxima”, Robert Priest resume quatro eras que amplamente moldaram a missão protestante no século anterior.5 Em 1792, William Carey tipificou a primeira era quando ele fez um chamado para que missionários estabelecessem a igreja fora de sua cristandade. Em 1865, na segunda era, Hudson Taylor mobilizou uma geração para que focasse nas regiões geograficamente mais interioranas onde o evangelho ainda não havia chegado. William Cameron Townsend, fundador da Wycliffe Bible Translators (1942) e do Summer Institute of Linguistics (1934), exemplifica a geração da terceira era, cujo enfoque estava na tradução da Bíblia para “grupos etnoliguísticos ainda não alcançados”. Uma quarta era, como Robert Priest a define, reflete-se em Ralph Winter no Movimento Perspectivas no Mundo Cristão – a “era do reino” em que missão passou a ser entendida em termos holísticos, cuidando das necessidades materiais junto com o evangelismo. O continente africano foi favorecido como um continente que recebeu missionários durante essas fases de missão de fronteira, interior, não-alcançados, e humanitária e holística. Mais recentemente, a África passou a moldar, significativamente, a narrativa do cristianismo mundial, evidenciado pela afirmação de que a força numérica da igreja deslocou-se para o Sul Global, junto com a surgente narrativa de missão reversa. Este é o contexto no qual imaginamos que o engajamento missionário na África precisa acontecer de agora em diante. Nesta próxima fase, dada a dinâmica de mudanças social e da população, a África precisará cultivar uma visão teológica integrada que possa agregar os benefícios de todos os esforços evangelísticos missionários.

Nesta próxima fase, dada a dinâmica de mudanças social e da população, a África precisará cultivar uma visão teológica integrada que possa agregar os benefícios de todos os esforços evangelísticos missionários.

Juventude africana

As igrejas precisam estar sintonizadas com a relativa juventude da população. A sociabilização que faz parte da visão cristã não pode ser deixada a cargo das instituições educacionais do Estado, embora ele deva ser estimulado a ainda ser responsável por promover a educação formal. A formação espiritual envolve mais do que ministérios de juventude. Ela inclui cultivar um hábito teológico que seja resilientemente pró-juventude, através de igrejas intencionalmente bem-discipuladas e de instituições educacionais com origem nas igrejas. O incontestável valor da juventude para a missão de Deus é confirmado no Velho Testamento, nas figuras de José, Davi, Jeremias, Josias, Daniel, Ester, Rute, bem como muitos dos companheiros de Paulo como Timóteo e Silas.

Desenvolvendo uma visão ética e moral

A África necessita de uma visão moral e ética inspirada em Cristo que esteja em sintonia com a demografia da classe média emergente. A tendência da igreja tem sido de, ocasionalmente, censurar o bem-estar material, falhando em considerar as implicações da melhoria das condições materiais para um continente sistematicamente assolado pela pobreza. Uma visão ética e moral mais cuidadosa será muito mais proveitosa já que uma porção significativa da população está pronta para se juntar à classe média em meio à desigualdade. Tal visão deve atestar a autenticidade e a credibilidade do testemunho cristão na arena pública para além das paredes da igreja.

Aprofundamento e consolidação teológicos

Não é muito apropriado repetir a ideia de que o cristianismo africano é raso ou que lhe faltam treinamento e recursos teológicos. Em décadas recentes, boa parte do esforço da missão cristã foi direcionado para a criação de escolas bíblicas, seminários, e universidades liderados por líderes e corpo docente locais. Em Gana, por exemplo, as igrejas transformaram seus seminários em universidades, como a Central University, a Pentecost University, e a Regent University of Science and Technology. No Quênia, as leis governamentais exigiram um “upgrade” dos seminários para universidades. Na África do Sul, a influência do universo digital melhorou o acesso à educação cristã. Além disso, algumas organizações globais como Langham Publishers, Oasis International e Tyndale House, entre tantas outras, apoiam a publicação e o acesso a conteúdo teológico no continente africano. A iniciativa Africa Leadership Survey revelou dados comprovando que os africanos são ávidos leitores da Bíblia e de uma variedade de livros devocionais e teológicos.6 A ScholarLeader Foundation, por sua vez, fomenta a formação de líderes cristãos no mais alto nível educacional. Os avanços em tecnologia e acessibilidade incrementaram grandemente o letramento bíblico, embora ainda seja um trabalho contínuo. África também possui uma robusta indústria de TV e rádio cristãos, que dissemina música cristã e pregações. Posto isso, as questões de evangelismo e atividades relacionadas à plantação de igrejas precisam ser melhor exploradas de diferentes ângulos práticos, inclusive mais preparação e treinamento profissional, prestação de contas dos recursos e a necessária estrutura eclesiástica institucional.

Conservando o testesmunho cristão africano

O cristianismo africano em geral permanece manifestamente conservador em termos cultural e teológico, independentemente das afiliações denominacionais. No entanto, polaridades cristãs concorrentes, muitas vezes originadas fora do continente (especialmente na América), exercem grande influência polarizadora sobre a igreja africana dentro de seu próprio continente. Líderes cristãos, missionários e parceiros terão de refletir como essas rivalidades importadas estão diluindo a presença cristã. Os líderes cristãos africanos deverão ponderar sobre as visões teológicas do Cristianismo que competem entre si (Cristianismos?), e não apenas sobre aquelas inspiradas pelo moralismo progressista liberal do ocidente.

Aprimoramento dos currículos teológicos

Enquanto a África se beneficia da multiplicação de instituções teológicas, uma vasta gama de seminários, institutos bíblicos e universidades cristãs ainda é largamente formatada por missões ocidentais em suas estruturas e seus currículos. Líderes de igrejas locais frequentemente avaliam isso como algo alheio às necessidades africanas, já que tendem a oferecer currículos gerais que ainda parecem mais ocidentais do que africanos. Faz-se necessária ainda muita reflexão sobre rever os relacionamentos entre igrejas e instituições de treinamento.

Missão voltada para o desenvolvimento

Uma outra preocupação frequente tem a ver com a atividade missionária voltada ao desenvolvimento. Apesar de, meritoriamente, atender as necessidades sociais, a ampla variedade de atividades empreendedoras ligadas à igreja, por vezes, traz preocupações em relação à sua principal atuação. Embora boa parte delas seja feita em nome da missão cristã, não é claro se tais atividades foram desenvolvidas sob uma égide biblicamente teológica, ou se aqueles que se beneficiam desses serviços reconhecem a diferença entre organizações cristãs e organizações de ajuda mundial. Existe bastante literatura que remete ao fato de a igreja ser, hoje, a nova OnG – organização não-governamental –, ou antes, OBF – organização baseada na fé. Uma crítica parecida é lançada contra os populares meios de comunicação cristãos, cujo foco está em mercantilizar a mensagem cristã sem ter um ethos teológico claramente bíblico. Estes problemas não se diferenciam em nada do que acontece em outros contextos, como nos Estados Unidos da América onde as contingências pragmáticas dão o contorno da atividade cristã, mas tais questões precisam fazer parte de uma conscientização auto-reflexiva entre os cristãos africanos na medida em que a igreja continua a crescer.

Contínua participação feminina na missão

As mulheres formam uma parte significativa da igreja na África. As últimas décadas trouxeram reconhecimento para a educação das meninas ao redor do continente. Diz-se que educar uma menina é o mesmo que exaltar todo um vilarejo. Apesar de o patriarcado permanecer uma característica de culturas políticas de boa parte da região, houve progresso em termos do empoderamento educacional das meninas e do destaque público de perfis femininos. De maneira correspondente, mesmo que as mulheres sejam nitidamente a maioria nas igrejas africanas, sua representatividade na liderança é mínima, e em algumas igrejas é inexistente. O contínuo empoderamento das mulheres como parceiras em pé de igualdade na missão de Deus, junto com os homens, terá um papel significativo no avanço da causa da missão local e no exterior.

Contestando práticas não bíblicas e encarando novos problemas sociais

Certas práticas culturais precisam ser continuamente contestadas: por exemplo, as pessoas portadoras de deficiências que historicamente sofrem estigmatização em comunidades cristãs. As doenças crônicas e deficiências são muitas vezes percebidas como maldição ou punição dos deuses/ancestrais devido à alguma abominação cometida pela pessoa, por um parente ou por um ancestral. Infelizmente, esta crença conduz, com alguma frequência, a práticas prejudiciais de exorcismo ao invés de aumentar o acesso aos ministérios apropriados. Um tema parecido que a igreja não pode ignorar é a vitimização de crianças e mulheres idosas sob a acusação de bruxaria. Como em qualquer contexto urbanizado, um problema emergente é a exploração sexual e do trabalho, e o tráfico de meninas e mulheres. As populações africanas também experimentam um ressurgimento de práticas culturais tradicionais que são contrárias à visão cristã, muitas delas revitalizadas pela globalização, pelo acesso às mídias eletrônicas e pelo oportunismo econômico. Além do mais, a igreja deve estar vigilante quanto à agendas dos múltiplos grupos de interesse dentro e fora do continente que, no meio da população jovem, buscam propósitos que negam a Deus.

Testemunho aos islâmicos e o conflito cristão-muçulmano

Embora o crescimento da igreja seja motivo de celebração, mudanças religiosas não são exclusividade do cristianismo. O Islã tem crescido exponencialmente. O norte muçulmano permanece largamente não-evangelizado, enquanto as duas religiões se encontram na região do Sahel. Organizações missionárias como a SIM e a WEC, que originalmente eram ocidentais, agora recrutam missionários africanos para o mundo islâmico, enquanto as organizações missionárias nativas, como a nigeriana CAPRO, estão alcançando os países muçulmanos. Nas próximas décadas, a proclamação do evangelho e a plantação de igrejas no norte majoritariamente muçulmano talvez sejam o passo vital das próximas décadas.

Não há transformação social que consiga afastar a necessidade do evangelho de Jesus Cristo. De fato, empre haverá novas gerações que precisarão ouvir e ser moldadas por uma visão do evangelho porque o único poder permanente que transforma a condição humana é o evangelho de Jesus Cristo.

Enquanto isso, o conflito cristão-muçulmano persiste. Alguns países como Gâmbia e Senegal oferecem modelos de coexistência pacífica, mas os países na linha fronteiriça do Sahel vivem em tensão. Os cristãos em áreas de fronteira geralmente são vítimas da anarquia terrorista. Como a expectativa é de crescimento da população, os conflitos continuarão a ser uma questão preocupante, especialmente quando são politicamente motivados e com foco nos recursos, como no nordeste da Nigéria e no chifre da África oriental. É essencial que os cristãos saibam discernir questões subjacentes e se envolvam de maneira apropriada em diálogos, cooperação inter-religiosa, reconciliação e mobilização cívica das respectivas autoridades. Sem dúvida, o evangelismo no meio das comunidades majoritariamente muçulmanas permanece como o foco principal.

Conclusão

Como há muito tempo cantou o salmista, a Etiópia (África) de fato correu para estender suas mãos cheias para Deus trazendo um tributo de louvor, ao lado de outras nações (Salmo 68:31–35). Junto com Israel, ela que antes era desolada agora é chamada Hefzibá, “(…) o Senhor se delicia em ti; e a tua terra se desposará” (Isaías 62:4). Porém, assim como Isaías viu nos tempos antigos, aqueles que clamam ao Senhor hoje em nome da África não podem se dar ao luxo de descansar. Enquanto nos regozijamos na maravilhosa graça de Deus sobre este continente que tanto cresceu no último século, há pouquíssimo espaço para sermos complacentes em relação à Grande Comissão. O inimigo anda em derredor procurando alguém para devorar (1 Pedro 5:8) através do pecado humano e das múltiplas expressões do mal na cultura, na política e no mundo corporativo. Não há transformação social que consiga afastar a necessidade do evangelho de Jesus Cristo. De fato,  a transformação pela qual a África está passando atualmente evidencia a urgência da Grande Comissão. Sempre haverá novas gerações que precisarão ouvir e ser moldadas por uma visão do evangelho porque o único poder permanente que transforma a condição humana é o evangelho de Jesus Cristo. A comissão para fazer discípulos, batizar e discipular permanece imperativa. Deixemos mesmo a África se erguer. Junto com ela, vamos todos nos erguer para levar o evangelho daquele cujo governo e paz não terão fim (Isaías 9:6–7). 

Notas finais

  1. Todd M Johnson and Gina Zurlo. World Christian Encyclopedia, Third Edition (Edinburgh: Edinburgh University Press, 2020).
  2. 2022 Revision of World Population Prospects. United Nations. https://population.un.org/wpp/.
  3. Ver: Jonathan Bonk et al. The Realities of Money and Missions: Global Challenges and Case Studies (Pasedena, CA: William Carey, 2022).
  4. See Paul Bendor-Samuel. ‘Mission, Power, and Money.’ in Missions and Money: Global Realities and Challenges (Pasedena, CA: William Carey, 2022) 138.
  5. Robert Priest. ‘A New Era of Missions is Upon Us’ in Evangelical and Frontier Mission: Perspectives on the Global Progress of the Gospel. Beth Snodderly and A. Scott Moreau, eds. (Minneapolis, MN: Fortress Press, 2011) 294-304.
  6. Ver: Robert Priest and Kirimi Barine. African Christian Leadership: Realities, Opportunities, and Impact (Maryknoll, NY: Orbis Books, 2017).

Autoria (bio)

Wanjiru Gitau

Nascida e criada no Quênia, Wanjiru M. Gitau é professora assistente de teologia prática e cristianismo mundial na Palm Beach Atlantic University. É a autora de Megachurch Christianity Reconsidered: Millennials and Social Change in African Christianity. Wanjiru, que viaja muito conduzindo pesquisas sobre missões, atua em várias plataformas de missões globais, entre elas a Rede Lausanne de Pesquisa e Informação Estratégica. Ela também faz parte do conselho consultivo editorial da AGL.

Seyram Amenyedzi

Seyram B. Amenyedzi é uma pastora/reverenda de Gana e, atualmente, supervisora na pós-graduação no South African Theological Seminary. Ela é uma pesquisadora bolsista junto ao Grupo Internacional Alemanha/África do Sul para Treinamento em Pesquisas, no tema “Religião transformativa: Religião como conhecimento situado em processos de transformação social”, financiado pela South African National Research Foundation (NRF) e pela German Research Foundation (DFG).

Fohle Lygunda

Fohle Lygunda é fundador e diretor executivo do Africa Center for Interdisciplinary Studies (ACIS) em Kinshasa, na República Democrática do Congo. Ele possui PhD em missiologia in pela North-West University, Potchefstroom, na África do Sul e um DMin pelo Asbury Theological Seminary. Ele é autor do livro Transforming Missiology: An Alternative Approach to Missiological Education (Langham, 2018).

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