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Uma carta aos nossos jovens líderes sobre o Relatório Ravi Zacharias

Michael Oh 13 fev 2021

Tenho certeza que seu coração afundou como o meu quando você leu as alegações de má conduta sexual de Ravi Zacharias. Nossos corações afundaram ainda mais após a leitura do relatório final que contém as conclusões da investigação de quatro meses que confirma o padrão de abuso, engano e manipulação.

Sem dúvida todos nós experimentamos diversas emoções através de nossas orações e lágrimas. Desapontamento. Tristeza. Raiva. Confusão.

Ravi era conhecido do Movimento de Lausanne. Ele palestrou mais recentemente em Jacarta, no Encontro de Líderes Jovens de 2016 (ELJ2016), onde muitos de vocês ouviram sua palestra: “Superando a Lacuna da Credibilidade Cristã”. Ele falou a verdade com convicção, sagacidade e poder, mas, na época, nenhum de nós estava ciente da grave lacuna entre a mensagem e a vida do mensageiro.

Não há nenhum entre nós que não reconheça uma lacuna de credibilidade em nossas próprias vidas. Qual de nós não está dolorosamente consciente de nossas falhas de caráter e de nossos próprios pés de barro? Tiago 3.1 traz, no entanto, um aviso: “Meus irmãos, não sejam muitos de vocês mestres, pois vocês sabem que nós, os que ensinamos, seremos julgados com maior rigor.”

Existe a realidade bíblica do pecado. E há padrões bíblicos para aqueles que ensinam e influenciam.

Não há dúvida de que há graça do evangelho para pecadores como nós. Essa graça é vertical, que recebemos de nosso Senhor quando nos voltamos do pecado e nos arrependemos. E há a graça horizontal que recebemos uns dos outros quando nos humilhamos para remover as máscaras que escondem nosso verdadeiro eu. O ‘amor genuíno’ de Romanos 12.9 é um amor, sine cera (sem cera) que esconde nossas verdadeiras imperfeições e feridas. Assim, de um crente sine cera a outro confessamos nossos pecados, um ao outro – aceitamos uns aos outros, perdoamos uns aos outros, e amamos uns aos outros.

Eu não conhecia o Ravi muito bem. Só tive algumas interações com ele em 2016 e em 2013 quando ele falou em Bangalore, Índia, em minha inauguração pública como o novo CEO de Lausanne. Mas suspeito que Ravi tinha experimentado graça horizontal de menos e tinha uma grossa camada de cera que escondia as fendas e imperfeições de sua vida. Entendo que Ravi não tinha muitos amigos próximos, mas reitero, eu não o conhecia bem. No mínimo, não ouvimos falar de nenhum amigo que o conhecesse suficientemente bem para estar ciente dos abusos e vícios de Ravi, nem para confrontá-lo sobre eles com amor e na repreensão.

Amigos, você e eu nos beneficiamos muito com o ministério de Ravi. Ele ensinou a verdade com acuidade mental, eloquência e coração. Que isso não nos seja tirado, mesmo nestes dias. Mas a prioridade mais importante para nós hoje é colocar em prática as lições que precisamos aprender para nossas vidas amanhã.

Permitam-me compartilhar muito brevemente algumas reflexões com vocês e encorajá-los a orar e acrescentar as seus próprios pedidos.

  1. Sou lembrado da necessidade de buscar mentores e influência divina em nossas vidas sem idolatrar essas bênçãos. A queda de figuras públicas é mais dramática e emocionalmente dolorosa quando as pessoas estão muito elevadas em nossos corações. As celebridades cristãs não têm apenas pés de barro, elas são feitas de pó e ao pó voltarão.
  2. Para aqueles de vocês que fazem parte da família GLJ (Geração de Líderes Jovens) de Lausanne, quero implorar-lhes que se entreguem ao Senhor e uns aos outros de modo que possam receber essa graça tanto vertical quanto horizontal. A gênese do GLJ foi o reconhecimento de que sete dias de uma conferência incrível não é suficiente para causar impacto a longo prazo na vida de um líder mais jovem. Isso levou à decisão de que o ELJ2016 fosse uma introdução ao GLJ, nosso investimento de dez anos em suas vidas. Falei muitas vezes sobre o quanto mais incrível e abençoado poderiam ter sido os ministérios de Ajith Fernando, John Piper e Ravi Zacharias se sua participação no primeiro ELJ de Lausanne em 1987 em Cingapura não tivesse sido apenas por sete dias, mas dez anos. Agora eu me pergunto o que poderia ter sido se Ravi tivesse se conectado de forma mais aberta e vulnerável com alguns poucos amigos fiéis naquela época.
  3. A falha de credibilidade sobre a qual Ravi palestrou não é menos verdadeira ou menos importante por causa do que foi revelado sobre sua vida. É ainda mais verdadeira e mais importante. Falamos tantas vezes em Lausanne de ser os SEUS (HIS, em inglês) líderes – líderes da Humildade, Integridade e Simplicidade, sobre os quais Chris Wright falou na Cidade do Cabo 2010.
  4. Temos um inimigo, e não é nosso próximo. Quando e se as fraquezas e os pecados dos cristãos forem revelados de forma pública ou privada, podemos tirar as vigas de nossos próprios olhos e chorar sobre a escuridão do pecado. Que nunca esqueçamos que temos de fato um inimigo que, como Ravi nos lembrou no ELJ, “procura desacreditar a mensagem destruindo o mensageiro”. Que possamos juntos nos opor a todos os seus modos astutos. Somos chamados a amar todos os outros inimigos terrenos, especialmente os da casa de Deus.
  5. Eu me perguntava onde está a justiça para Ravi e suas vítimas, especialmente com o fato de Ravi ter falecido antes que tudo isso fosse revelado publicamente. Ravi escapou do confronto e do acerto de contas terreno. Mas já aconteceu a justiça definitiva. E isso foi à custa da cruz de Jesus. Jesus teve que morrer pelos pecados devastadores de Ravi. E pelos nossos. Deus não tratou os pecados de Ravi com leviandade, e nós também não.
  6. Mas ainda há vítimas que foram deixadas desiludidas e quebradas. Como podemos endireitar tantas injustiças em suas vidas? Através da mesma cruz. A cruz da justiça é a cruz do conforto. A cruz das feridas de Cristo é a fonte de nossa cura. Não somente de forma teórica ou teológica, mas de forma prática também. Que a prática desse amor prático abunde em nossas próprias vidas. Houve tantas vítimas conhecidas e desconhecidas. Somente Deus conhece todas. Que Ele se faça conhecido a elas através de Seu povo. E que não criemos mais vítimas, ou esfreguemos sal nas feridas dos outros ao, por exemplo, faltar com compaixão para com a Margaret, esposa do Ravi, e sua família.
  7. Por último, que não nos enganemos ao aceitar a mentira de aprendermos a ser “frutíferos” sem sermos puros. Eu escrevi sobre esse tópico na véspera do encontro na Cidade do Cabo em 2010 para minha geração de líderes jovens, e agora, eu repasso isso para vocês.

Por que sentimos tanto luto diante disso tudo? Sem dúvida é porque isso enche de luto o coração de Deus. E eu lamento o luto que isso causou a você também.

Mas deixar de aprender com essa lição somente entristeceria ainda mais o coração de Deus.

Portanto, pela graça de Deus seguimos…

Michael